UM VELHO músico judeu que vive em Londres disse uma vez que o maestro judeu argentino Daniel Baremboim era o melhor pianista palestino de sempre. Obviamente que não era um elogio. Antes se tratava duma… sarcástica “judiaria”, a propósito da Alta Autoridade da Palestina ter concedido, honoris causa, a cidadania ao famoso maestro que tanto pugna pela reconciliação entre os dois povos.
Os ultraortodoxos de Israel e os fundamentalistas de Alá são muito
parecidos e puseram-se de acordo considerando, uns e outros, Baremboim um
inimigo e um impostor. Baremboim expôs-se para evitar a deflagração numa
aventura quixotesca. Não somente na fronteira entre Israel e a Palestina, tão
abalada pelos desígnios eleitorais de Netanyahu, mas também na linha de
separação entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul, cenário de um concerto
especial que o maestro dirigiu.
O vigor com que Baremboim defende a convivência de Israel e da
Palestina como estados independentes e reciprocamente reconhecidos converte-o
num terrorista, bode expiatório de ambos os fanatismos. À pedagogia política da
sua orquestra palestina-judaica soma-se o excelente resultado musical. A sua gravação
das “Nove Sinfonias” de Beethoven, produzida no curso duma “tournée”
internacional, rivaliza com as melhores edições disponíveis no mercado.
Baremboim é um excelente maestro e um cidadão comprometido.
Combateu o muro de Berlim, conseguiu que a música de Wagner fosse tolerada em
Israel e dirigiu o “Anel do Libelungo” na colina sagrada de Bayreuth. Pode
dizer-se que é também um dos melhores pianistas espanhóis, depois do Governo de
Zapatero lhe ter concedido passaporte ao cabo de tantos concertos oficiados na
península...
O maestro tem uma casa perto de Marbella, próximo de Puerto Banus.
É aí que se refugia, de cada vez que quer ouvir o silêncio e desfrutar do prazer
do anonimato. Quem sabe onde ele mora é o afinador de pianos que costuma ser
chamado lá a casa depois daquele primeiro telefonema em que o maestro disse:
“Sou Baremboim e precisava que viesse afinar-me o piano!”
“De que bar disse o senhor que fala?” perguntou-lhe o homem, numa
primeira conversa entre os dois que o maestro, até hoje, converteu em
irresistível anedota.
In Sorumbático, 26 Dez.12
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